quarta-feira, 3 de novembro de 2010

liquidez e concreto



Inspiração para minha janela; pelo buraco da fechadura vejo uma mulher, paredes de concreto e uma infiltração-fonte de água. Que a água alague tudo, vou inundar a casa.

Conto nº204
Moradas do Ser - Marina Colassanti

"A nascente apareceu repentina ao pé da cama. Irritou-se a príncipio, tanta água estragando o sinteco. Nem identificou a poça, constante apesar de panos e baldes.
Logo teve que se convencer. Água surgia do cimento, taco, sem que cano algum passasse pela vizinhança. Era a benção de uma fonte.
Banhou-se então seguidas vezes na água milagrosa. Ao entardecer despia-se, levantava a água nas mãos em concha e a despejava sobre seu corpo. Não tornava a vestir-se. Deitava nua na cama, lavadas as carnes, preciosa a pele. E com mãos suaves alisava o corpo santo, acariciava-se em redescoberta do amor. Suspirosa adormecia seu sono de festa. Aumentando a água, infiltrou porém o teto do vizinho. Que houve por bem reclamar com porteiro síndico polícia, comparecendo o bombeiro a mando da lei para, cimento e brocas, acabar com o estranho surgimento.
Ao entardecer brilha seco o sinteco. Mas do umbigo, fresca e clara, água brota alagando o ventre, lavando as carnes brancas sobre a cama."

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